Operação 404 derruba IPTV piratas, mas usuários seguem migrando para novos serviços

A queda de grandes serviços de IPTV pirata durante a Operação 404, em novembro de 2025, praticamente não mudou a rotina de quem já vive nesse submundo digital. Para Ronaldo*, morador da Zona Leste de São Paulo, a interrupção do TV Express Brasil virou só um intervalo comercial. Quinze dias antes da operação, seu vendedor já tinha avisado que o aplicativo seria derrubado e recomendou um substituto.

Esse tipo de movimento deixa evidente o desafio das autoridades. O preço baixo, a quantidade absurda de canais e a velocidade com que novos serviços surgem fazem do mercado de gatonet um ecossistema difícil de desmontar. Entre os mais populares estão My Family Cinema, Eppi TV, Yoon Cinema, BTV, UniTV e muitos outros entre mais de 300 derrubados pela Anatel e pelo Ministério da Justiça.

Ronaldo pagava R$ 70 a cada dois meses para acessar cerca de 380 canais via TV Express Brasil. Bastava conectar uma TV Box sem homologação da Anatel, inserir o código enviado pelo vendedor e pronto. Todo o conteúdo de plataformas pagas ficava liberado: filmes, séries, jogos e transmissões ao vivo.

Pouco antes da operação que tirou o serviço do ar, o vendedor avisou pelo WhatsApp e ofereceu a migração para outro app: RedPlay Box, compatível com TVs Android e com mais de cinco mil canais por R$ 25 ao mês. Esse ainda está funcionando, mas, segundo Ronaldo, muitos já migraram para outro nome popular no momento: Nexa TV Box.

O esquema é sempre parecido. O usuário paga por um código, digita no app e recebe um prazo de uso. Quando o limite acaba, ganha algumas horas de “bônus” para comprar outro código. Enquanto os apps são removidos das lojas com mais facilidade, sites seguem trocando domínios rapidamente, dificultando qualquer bloqueio efetivo.

Além das plataformas via navegador e dessas TV Boxes, há também os famosos APKs, instalados manualmente em celulares Android. Vendedores chegam a oferecer testes gratuitos de 24 horas para atrair novos usuários.

Apesar de tudo parecer improvisado, o mercado é gigantesco. A Alianza, entidade contra pirataria audiovisual na América Latina, estima que os serviços derrubados tinham juntos cerca de 4,6 milhões de assinantes no Brasil. Considerando o plano mais barato, de R$ 25, isso representa algo em torno de R$ 115 milhões mensais, ou mais de R$ 1,3 bilhão por ano.

Com tanta grana envolvida, Ronaldo acredita que nada muda de forma definitiva. Para ele, é apenas uma fase, e tudo volta em pouco tempo.

Mas essa prática tem riscos reais. Em agosto, veio à tona que 1,5 milhão de TV Boxes piratas no Brasil estavam infectadas pelo malware Bad Box 2.0. Esses dispositivos enviam dados pessoais para operadores maliciosos, executam cliques falsos em anúncios e podem participar de ataques DDoS.

O perigo também vale para APKs baixados fora de lojas oficiais. Quando o usuário instala um app externo, abre mão das proteções de segurança da Play Store. Isso facilita roubo de dados, golpes financeiros e outras formas de exploração digital. Por isso, especialistas recomendam ficar somente com lojas oficiais como Google Play e App Store.

Na parte jurídica, o usuário final não costuma ser enquadrado por crime de pirataria, já que não é o responsável direto pela distribuição dos conteúdos. Ainda assim, os riscos tecnológicos e legais do ecossistema gatonet vão muito além da economia no fim do mês.

O fenômeno segue existindo porque reúne três ingredientes difíceis de combater: baixo custo, alta conveniência e um mercado clandestino que sempre se reorganiza. A discussão sobre pirataria, segurança digital e regulamentação ainda deve render muitos capítulos — dentro e fora das operações policiais.